sábado, 30 de março de 2013

pílula de sabedoria [II]

Existe é exagero de zelo. Exagero de amor, por bicho ou gente,
não existe. O amor não tem limites. E independe do objeto. 






 Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Fernando Pessoa.

pílula de sabedoria [I]

Se continuares bebendo desse jeito toda vez que morre alguém 
que tu amas, morrerás antes dos alguéns que tu amas. 
E não haverá trago no teu velório lotado.

Amigas,

Amigas,

Estou tão triste. Parece que vou implodir. Sinto uma falta de vocês que não sei como explicar. Ou escrever. Não citarei nomes, porque sei que vocês sabem quem são. Minhas amigas. Ressalvo que não as vejo como um bolo, uma massa. Reconheço e sinto a falta de cada pedacinho isolado de cada uma de vocês. Vejo suas carinhas na minha memória, que hoje está em sépia, combinando com o outono. 

Essa falta que eu sinto não se chama saudade, tem outro nome, não sei que nome tem. A tristeza esvaziou meu vocabulário, roubou minhas palavras companheiras. Está difícil encontrar um discurso que exprima o montão de coisas que quero dizer a vocês, especialmente sobre o teor dessa falta que aparece tão nítida na dor, como acontece com qualquer ser humano egocentrado e frágil - e talvez por isso mais humano. Está difícil abstrair, então me restinjo a descrever: 

escrevo com o note sobre a mesa da sala, a tv está ligada no Jornal Nacional, B2 está deitado na caminha dele, acordado, e há pouco veio me cheirar, enquanto B1 dorme o sono profundo de quem deseja a liberdade azul - tudo sob a luz cálida daquele abajur romanesco que eu tinha no escritório da casinha encantada.

Não sei até quando poderei viver essa cena, nós três, os mosqueteiros, juntos, numa noite de outono. Talvez essa seja a última. E talvez por isso eu sinta a falta de vocês como nunca.   


Beijos vertidos para sempre 
(pois eternizei esse momento), 
C.


PF, 26 de março de 2013.







[foi mesmo a última noite]
Belot (15 de novembro de 2002 - 27 de março de 2013.



http://www.orkut.com.br/Main#Profile?uid=3177187200801481312

terça-feira, 26 de março de 2013

exercício - pontuação ao sentir

não existe nada mais cansativo que sofrer. como outros já disseram, depois da tristeza vem (e vem mesmo) o cansaço. junto com um sofrimento que não mais se traduz por "tristeza". tem outro nome. não sei que nome tem. "sufocamento", talvez. "melancolia", talvez, também. 

está difícil respirar. meu cachorro está morrendo. o cachorro que mais amei dos tantos que tive. só agora percebo a força do afeto que deposito nesse Cão. é uma montanha de amor! donde lá de cima vi a vida tantas vezes... e ri tantas vezes de coisas banais, insólitas e até idiotas. e chorei tantas vezes por coisas banais, insólitas e até idiotas. 

depois de idas e vindas emocionais, escolhi a gratidão. estou fazendo de tudo para que seus dias finais sejam bons. eu canto, eu danço, eu cozinho pra ele, eu limpo o jardim, eu corto os cabelos. eu busco a leveza. e agradeço. sempre.


existe exagero no amor por um cão? acho que não. existe exagero de zelo, e só. exagero de amor, por bicho ou gente, não existe. o amor não tem limites. piegas? é. mas é. sem limites. eu acho que sim e espero continuar achando. 
por toda a minha vida. 

sou grata pela oportunidade de tê-lo em minha vida. e também sou grata por esse imenso amor que sinto. 

segunda-feira, 18 de março de 2013

o que não mata fortalece


envenenaram o meu cachorro. sim, é isso mesmo que vc acabou de ler. foi isso mesmo que ouvi do veterinário - diante dos exames e circunstâncias, era a explicação possível. como? quem? por quê? mas vendo aqueles olhos tristes, anêmicos e agonizantes, eu só sentia medo. depois, entendi com todos os meus sentidos a frase de mestre heuser "odeio a humanidade, eu gosto é de indivíduos". e, mais depois ainda, penso que entendi o desejo de quem compra uma arma. sim, é isso mesmo que vc acabou de ler. mas... passados outros depois, a duras penas, para não cultivar ódios e mágoas, optei pela gratidão. meu cachorro sobreviveu (melhor, está sobrevivendo) - agradeço à deus e à ciência, ao cosmos e ao veterinário.

não quero saber quem fez nem por que, e não me darei ao trabalho de tecer comentários morais a respeito. termino esse post dizendo apenas que é madrugada e que estou escrevendo para poder dormir! - numa cama improvisada ao lado do cachorro, que respira bem e até já balança o rabo. 


O que tu fizeste daquilo que te fizeram?  Sartre[?]

sexta-feira, 8 de março de 2013

(o meu brinquedo de estar)

 http://www.youtube.com/watch?v=TB6Cpy-X7A8&feature=share


http://www.youtube.com/watch?v=jfw7XVkLqlY


é mais difícil não

é mais difícil não fumar quando chove. 

é mais difícil não dormir aos domingos. 



bem melhor

cansei de ser sexy, inteligente, espirituosa, divertida, interessante, corajosa, sensata, generosa, forte, disposta, leve, perfumada, agradável, alegre, conveniente. cansei de não ser eu. e é por isso que me tornei melhor.

então

estou cagando para com-quem você dorme. cago para quem você come. se mulher ou homem. se gata ou gato. se cachorra ou cachorro. só quero ser sua amiga, sua colega, sua vizinha, sua parceira. para tanto, vejo apenas, do seu pensar e agir, a sua maneira. 


quarta-feira, 6 de março de 2013

a vida é

esquina. ponte. comida. maçaneta.
telhado. pedra. janela. caneta.
ônibus. parada de ônibus. bicicleta.
computador. jardim. dinheiro. televisão.
mala. espelho. telefone. café. chinelos.
cadeira. caneca. picolé. nuvem. chaveiro.
muro. mato. bicho. filho. vizinho. martelo. chuveiro.
tinta. vassoura. chiclete. calçada. caramelo.
concha. colcha. cama. relógio. travesseiro.




(em todos os sentidos e nenhum)

para registro

para registro: os três textos abaixo foram escritos corridos num tempo que pra mim foi outro. pela regra comum, 3 min entre o primeiro e o segundo, 2 min entre o segundo e o terceiro. para mim, 3 dias e 2 horas. estranho isso.



(continua...) postado agora pra não perder o lugar na fila




O tempo é universal. A percepção do tempo é singular. 

Se a única realidade que temos são os instantes percebidos, 
o resto passa perdido e não interessa o final.  

ares

A mulher com ares de pesonagem do Woody diz pra outra: "Quem te criou foi Pedro".  Esta não diz nada, só traga o cigarro e ri - enquanto a primeira ajusta a fivela da sandália pela décima terceira vez.

Estão numa mesa de bar, numa noite de inverno. Sábado de madrugada. O bar está cheio. Música alta. Dá preguiça conversar. Passam o tempo observando as pessoas em volta da mesa que mais é uma tela iluminada. Há dois lugares vagos nessa tela. Elas anseiam completá-la. Como um álbum de figurinhas. Estão valendo até as repetidas.

Já tocou de Janis a Maria. Nada acontece por cerca de duas horas. As mulheres pegam suas maxi bolsas e vão embora. 

Em suas casas, dormem. A primeira, com um pijama de flanela. A segunda, com um baby-doll de cetim. E lá, na tela iluminada, sentam dois caras. Um com ares de personagem do Wong. O outro criado por Win. 





Há dois lugares vagos na tela. Eles anseiam completá-la. Como um álbum de figurinhas. Não valem as repetidas.  
     

minto

minto porque gosto de inventar. não tem nada a ver com enganar. 



tem a ver com fabricar. 

escrever. 

ainda que falso e vão. 

faço.

gorda

só percebeu que estava gorda quando se viu refletida no vidro da vitrine. vendo-se gorda, entrou na loja - a fim de chancelar a conclusão, tirar a prova, pôr o pingo no "i". escolheu quatro calças jeans. entrou no provador hiperiluminado. visualizou no espelho sua imagem rechochuda e nua. dectectou celulites - novas celulites. lamentou em silêncio, como guardando um segredo. vestiu a primeira peça. abominou sua bunda. desvestiu suspirando. vestiu a segunda. execrou seus culotes. desvestiu murmurando. a terceira não entrou. e na quarta percebeu a barriga - nova barriga. desvestiu gargalhando. alto. porque gostou do que viu das costelas pra cima! peitos fartos e ombros largos. corada. sem rugas.

foi embora satisfeita. não levou nenhuma calça, mas chancelou a conclusão. e comprou quatro blusas. 


sexta-feira, 1 de março de 2013

quando dei por mim

eu rolava na grama. mantinha os olhos fechados e a boca aberta para morder o capim. nadei na terra. esfreguei o nariz no sereno, verde-branco orvalhado. removi pedras buscando o cheiro. alcancei raízes firmes e cavei. mastiguei minerais. sorvi água morna e rolei um pouco mais. umedeci. o calor dissipava. meu coração batia na mesma proporção, desacelerando. lati. eu era um cão.