quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

a vizinha

a vizinha passa todas as manhãs falando da vida dos outros. do novo emprego do filho da amiga, da safadeza do cunhado, das dívidas da enteada, da saúde da colega de ginástica, da casa suja e cara da comadre, do carro novo do namorado da filha do primo distante, da promoção com salário dobrado da irmã da mulher do primo distante que tem o genro de carro novo. 

a vizinha passa todas as manhãs reunida com pessoas, no pátio da sua casa, tomando chimarrão e falando. vêm gente de todo canto, para provar sua erva e ouvir suas histórias. é só ela quem fala. sua voz é grave e forte, encorpada. de longe dá a impressão de que ela está palestrando, mas basta atentar para o assunto para perceber que não. é fofoca mesmo. e que público interessado! não se ouve um suspiro! mas se intui aplausos. 

perto do horário do almoço as pessoas vão embora. ouço os "até logos" e o barulho dos carros. a vizinha não convida as pessoas para almoçar. ela almoça sozinha. 
  

eu hoje passei a manhã escrevendo sobre a vida da vizinha. em silêncio e sem platéia. 




terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

se você

se você pensa que vai fazer de mim o que faz com todo mundo que te ama, acho bom saber que não. se você disser que eu desafino, amor, eu gritarei mais alto.


(se você pretende saber quem eu sou, saiba que eu também).

o velho

a rua estava deserta e silenciosa. dava pra ouvir o apito do trem. o velho caminhava na calçada com uma tesoura no bolso do paletó. fatiota xadrez. parava em frente aos muros das casas - muros baixos de interior. olhava ao redor e limpava o suor da testa com um lenço de seda, fúcsia. empunhava a tesoura, num suspiro de pesar, e cortava flores de árvores e arbustos. montava um buquê. pra dar pra velha. 

puxa vida

dia sem chuva nem nicotina. sensação térmica de 40°C. implodo. incendeio e viro pó. é minha quarta-feira de cinzas. veio numa quinta, nove dias depois do carnaval.

kabuletê

emoção que regozija, oh. estesia? sei lá da tonga. e da mironga. 
só sei que esse kabuletê é bom.








quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

voltei a ouvir

voltei a ouvir pedro veríssimo. caminho a esmo por ruas horrorosas e as acho bucólicas. me pego contemplando um mosquito num vôo tonto. não ouço o trânsito. 




Sendo um pouco como o vento.

eu quero que chova

Eu quero que chova.

Para não recolher as roupas. Vê-las encharcar e escorrer. 

Para não sair de casa. Para ver nascer caminhos d'água. Para molhar a grama amarelada. Para varrer as folhas do telhado. Para mergulhar as britas cagadas. E ver o incinho emergir.

Para ninguém passar na calçada. Para saber da cidade vazia. Para escrever e nada.

pois então ele chega em casa

Pois então ele chega em casa. Cara de quem aprontou. Cabisbaixo. Coluna curva. Cifose transitória. Tatu-bola encolhido. Ele senta no sofá e suspira. Suspira fundo como há muito tempo não. Sente-se culpado? Quando parecia encher o pulmão para pronunciar uma palavra, levanta-se, mudo. Esfrega uma mão na outra, como se as estivesse lavando no ar. Água imaginária. Nervos. Crime. Ele senta na poltrona. Apóia a cabeça no encosto. Olha para o teto mofado como quem contempla uma nuvem. Suspira e suspira. Coça o nariz. Espirra. Cheira a ponta dos dedos da mão direita. Disfarça a cara de nojo. Ele olha para a janela. Olha pela janela. Sombrancelhas caídas. Mãos inquietas. Respiração irregular. Garganta embaraçada. Pigarro. Ele está calado, parece que engoliu uma pedra. Tampa de poço. Rolha de poço. Tampão. Catarro.

Sinceramente, eu preferia que ele continuasse assim. Que não dissesse nada, que guardasse para si todo o lixo que chafurda quando está longe de mim. Essa sujeira fede e pesa demais. Merda incontinente. Não sei se ele é fiel ou egoísta, só sei que daqui alguns segundos ele vai confessar: "Fumei". 

 

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

para mim

o meio termo é melhor que o extremo. para mim. 




sou mais verdadeira num volume médio - o alto me oprime, o baixo me irrita. prefiro o branco sujo ao branco alvo. prefiro um copo pela metade. prefiro o amor à liberdade. não quero morrer bem velhinha, quero ser pega ao menos caminhando. onde nem lá nem cá. meu lugar é o caminho. do meio.

cai a máscara do sujeito disfarçado de suspiro

esse negócio dá um amargo na garganta. uma secura, uma coisa estranha. acelera o coração. causa suador. ontem deu tremedeira e vômito. e ainda assim alivia a pressão. eta vício desgraçado, o cigarro. um adesivo de nicotina na pele faz o maior estrago, mas te deixa apto. segura a tua onda e solta o diabo. dá pra ver direitinho a cara do danado.





O cigarro é uma maneira disfarçada de suspirar. Mario Quintana.

[após pensar e pensar no que disse MQ, distorci a mensagem no título. de propósito.]  

sou ótima conselheira

Sou ótima conselheira porque já fiz muita merda nessa vida. Comecei a fumar pra tirar onda de bacana, no início dos anos 90 - quando fumar ainda era bacana. (Quem nasceu nos anos 70 só pensou em saúde depois dos trinta anos). Dormia o dia inteiro. Bebia feito louca. Viajava com drogas bizarras. Só comia miojo. Dirigia um fusca lotado de desconhecidos. Estudava pouco. Lia coisas deprimentes. Trabalhava sem afeição. Gostava de homens problemáticos. Achava minha mãe uma mala. Me deixava enganar por gente mais louca que eu. Preferia a simulação à realidade. Andava extasiada e trôpega. Mas fui. Não parei. Eis que me tornei mentora, preceptora das personas que passam por aqui. Este blog é cheio de gente. Povoado de personalidades. Incluo nisso aquele que escreve, o narrador, o dito cujo que se apossa da minha primeira pessoa. Personas gratas pras quais dou carona. Creio que não as crio, apenas guio. Nunca precisei inventá-las. As merdas dessa vida sim, tive que inventar.
 

parar de fumar (II)

Parar de fumar é um ato bravíssimo, eu já escrevi isso antes. E escrevo de novo, agora com muito mais propriedade. Estou parando. Sim. Não fumo desde domingo.

Já parei de fumar outras duas vezes, mas isso não vem ao caso aqui neste post. Cada caso é um caso e cada um deles deve ser isolado para ser melhor vivido. Todas as vezes são diferentes, e essa diferença é que torna o ato especial - no sentido literal, pontual e total, certeiro da palavra. Enfim.

São 15hs de terça-feira e já devo ter pensado umas dez vezes em acender um cigarro. Penso de forma inconsciente, natural, distraída. Aí lembro que parei. Stop. Quit smoking. E okay. Aí eu bebo água. Rôo unhas. Caminho pela casa. Escrevo. Lavo o rosto. Abro as janelas. Oh God... save the Queen. #sunnyday.



Fumei meu último cigarro domingo à noite, chorando. 

Segunda-feira vomitei todos os litros d'água que ingeri. 

Terça-feira escrevi este texto.

Quarta-feira eu não sei.

O vício é um Rei insano e imprevisível, desatinado. É preciso encará-lo com firmeza e humor. Como uma Rainha brava, que dá o xeque-mate num típico e resplandecente sunny day.      


quinze passos para curar uma ressaca

Nenhum conhecimento é tão irrisório que não mereça ser compartilhado.


Quinze passos para curar uma ressaca (ou vivê-la da forma menos pior possível):


nº1: Assuma. Assuma seu porre para si mesmo e para terceiros, amigos espectadores de sua performance etílica (mas ainda não faça contato com eles*). Diga em voz alta para si mesmo que, sim, você bebeu sem respeito nem moderação. 

nº2: Não se culpe. Emebebedar-se é, antes que sinal de fraqueza, um sinal de humanidade.

nº3: Não se arrependa. Toda a experiência que envolve emoção e revolve a mente é válida. 

nº4: Beba água, suco ou isotônico. Beba quantos goles d'água e/ou de suco de fruta forem possíveis no menor intervalo de tempo possível. Se estiver difícil, beba poucos e pequenos goles de isotônico.

nº5: Esconda as provas do porre. Tire do seu campo de visão tudo que remeta à bebedeira. Ponha as latas/garrafas de bebida no lixo e os copos de molho na pia. Junte as almofadas, cds/vinis e etc do chão. 

nº6: Tome uma ducha e troque de roupa. Comece molhando a cabeça com a água fria e vá esquentando-a aos poucos. Vista uma roupa confortável, limpa e bonita (não se enfeie, de esculhambado já basta o seu corpo e a sua alma).

nº7: Coma alimentos leves e oleosos. Tais como: castanhas, queijo ou amendoím, se possível. Se impossível, parta para a canja de galinha com um fio de azeite de oliva.  

nº8: Relaxe. Pense na novela, num filme, num livro, numa música, numa praia, num jardim, num momento feliz de sua vida - respirando com consciência.

nº9: Sinta e agradeça. Sinta como é bom estar inteiro e perceba o quanto você é merecedor disso. Agradeça ao seu anjo da guarda (ou a Deus, ao cosmos, aos duendes e fadas da sorte).

nº10: Durma. Durma em frente ao ventilador ou com o ar condicionado ligado. Deixe o quarto à meia luz (de preferência luz natural), sem rádio nem tv ligados. 

nº11: Ao acordar, coma uma junk food. Peça uma tele-entrega de xis, pastel ou pizza. Encha a barriga assistindo tv. 

nº12: Faça contato*. Agora sim, via torpedo, dê notícias aos amigos espectadores de sua performance etílica. Mas seja sucinto e não seja dramático. Escreva apenas o necessário para assumir o porre e avisar que você está bem. Por exemplo: "Que porre! Já estou melhor. Bj!". Ou: "Recuperado (a) da bebedeira. Tudo ok comigo. Bj!". 

nº13: Tome um banho demorado. Faça muito xixi e escove os dentes com capricho debaixo do chuveiro. Use o seu sabonete preferido, aquele reservado para momentos especiais.

nº 14: Prepare-se para dormir até o dia seguinte. Troque os lençóis, deite-se com um pijama/camisola ou camisetão de cor clara (também confortável, limpo e bonito) e deixe uma garrafa de água gelada ao seu alcance. 

nº 15: Perceba que você existe. Perceber-se existente é redentor. 




Até pra morrer você tem que existir. Otto.  

      

antes de cozinhar

Antes de cozinhar, lave bem a cabeça. Deixe escorrer pelo ralo tudo que aborreça. Para que o milagre aconteça, impeça os maus pensamentos.

[O sabor adormece quando a alegria arrefece].  


sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

não adianta

Não adianta esbravejar, ninguém temerá a tua ira. Não adianta chorar, lágrimas não corrigem nem refundam. Não adianta parar ou insistir, o tempo é um rei intransigente e o curso da vida é incorruptível. 

E não adianta lamentar




(-se),






o pretérito do subjuntivo é imperfeito.

o gato faz a maior bagunça

o gato faz a maior bagunça. a casa nunca mais foi a mesma depois que passamos a coabitar.

tem rolo de papel higiênico puxado até o chão. têm bolas de meias espalhadas pelo quarto. têm almofadas rolando pela sala. todos os copos estão sujos. a pia está lotada. acordo chutando chinelos. não encontro meus óculos. livros e revistas formam escombros. 

há tantos fios de luz rente às paredes que não podem ser meramente fios de luz. são fios de computador, periféricos, ex... tensões. para liquidificador, repelente, tv, dvd, aparelho de som, celular, iPod, iPad, iAi. 

a zona do gato agora é minha. onde foi parar a aspirina? 

deixei os comprimidos em cima da geladeira, entre o pinguim e a bomboniere. ou sobre a mesa da cozinha, junto com o pão e o controle remoto da televisão? sim, mas não. foi parar no banheiro, sobre a caixa de descarga, junto com o telefone sem fio, o desodorante e o rádio à pilha.

a bagunça do gato é hors concours na maravilha! (a dos cães é fichinha).