quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Julia

Sequestrou o meu coração e, depois, o meu cérebro. 
Escrever está difícil, porque (está) insuficiente.




Se por surpresa ou por feliz, não sei. Só sei que está.



sexta-feira, 9 de agosto de 2013

ando branda

Ando branda 
há muito.

Se bom ou ruim
só cabe a mim.


Fim.

Bom humor

Bom humor: não saia de casa sem ele, e sem ele não volte pra casa jamais. 



Porque só o humor salva. 
Porque sem humor não se encontra (nem) Jesus.  




empatia

A empatia é diretamente proporcional ao amor da gente por a gente mesmo - conclusão a que cheguei depois de perceber que eu gosto da minha vizinha mesmo que ela nunca tenha me dado qualquer motivo senão ter me emprestado os seus olhos para que eu pudesse me ver melhor.

inços & aquilos ◄ : 228 days ago

inços & aquilos ◄ : 228 days ago: chove a cântaros. os passarinhos não cantam. [@ellacarlinha on twitter]

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

18h21


são 18h21. nem mais nem menos, antes - porque agora sim. mas sei lá, também. dizem que o tempo são tempos que correm em paralelo. naquele exato recorte, então, foi 18h21. 



só sei que em todos os tempos sou só humor e pregui  ç     a

quarta-feira, 31 de julho de 2013

num dia como hoje eu

num dia como hoje eu só tenho a agradecer. ao sol que abraça os cachorros e seca as roupas recém lavadas. ao cheirinho das roupas que se mistura com o do mato, perfumando a casa de aconchego e vento. ao vento que vem do norte carregando o barulho da cidade. ao barulho da cidade que traz de carona o apito do trem. ao trem que me leva a trilhar as palavras. às palavras das quatro horas de uma quarta de poesia e incensos. eu agradeço.   

sexta-feira, 19 de julho de 2013

gê,

eu queria ajudar-te em tudo. acabar de vez com teus problemas. resolver tua vida. te dar paz e comida. pra que teu mundo virasse um poema. 

se eu tivesse tal poder, faria. o mais bonito é que tu nem desconfias.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

tão emburrada

estavas tão emburrada que aquilo só podia ser tristeza. te conheço de todas as vidas que cabem nessa, e nunca te vi mais avessa. tuas sobrancelhas emolduravam tua magreza. não tive pena nem raiva. só dúvida. e o mais que pude, delicadeza.

superlativo

é chegar em casa e sentir-se dentro de um travesseiro, tal o aconchego.

"vândalo"

palavra péssima, feia. e tendenciosa. parece fragrância de desodorante barato. ou xarope pra azia. ou diluente de tinta.

acidente


 bfb ufy5 
       kojionb

quarta-feira, 17 de julho de 2013

gosto desse horário

gosto desse horário. os raios de sol têm de se esforçar pra entrar pela janela. tudo silencia e consigo ouvir melhor. acendo o abajur e a lareira. chamo os cachorros pro sofá. ouço a respiração dos dois. abro o livro enquanto o sol se deita na parede da sala.

pós-encontro com walter [cont.]

"prosa delirante. poesia latente. quebra inconsciente de regras. deslizes ternos. acepção sonegada. três doses de gim. só uma lata de tônica. marola ampliada", walter escreveu num papelzinho enquanto eu estava no banheiro, e me entregou na nossa despedida. li quando já estava dentro do táxi. achei cafona, porém fofo. sobretudo porque o papel estava dobrado em forma de barco. em seguida a doçura me abandonou, porque percebi que walter fez tal gentileza para se livrar do fardo de ter que escrever sobre os meus escritos. fiquei puta da cara. demorei pra dormir e sonhei que estava num navio, armada de um estilingue e com duas pedras no bolso. eu procurava um alvo inerte para acertar. todos os possíveis alvos eram móveis, e eu não podia errar. comecei a enjoar. o navio balançava como uma jangada. ondas vinham em sentido contrário, da beira da praia para o alto mar.  eis que vi o quadro do van gogh com moldura dourada e paspatur azul. e também o relógio da pepsi. ambos parados. alvos perfeitos. mas eu estava mareada, sem equilíbrio. sofri para cacete até que walter apareceu. trazia um canudo de formatura na mão e estendeu em minha direção. quando segurei o canudo, o meu enjoo se dissipou e o navio parou de balançar. mas não pude atirar nos alvos inertes. eu estava com as duas mãos ocupadas. acordei. pesadelo de sonho, esse. não dormi mais. escrevi um texto de nove páginas - para o desgraçado do walter. após cada frase abri um parêntese para explicar o que eu dizia. comecei contando o sonho com todas as metonímias, aliterações e metáforas que consegui. terminei mandando ele se cagar, novamente. fiz o mais lé com cré inteligivelmente possível, especialmente no entre parênteses. mandei por email. passados 40 minutos de insônia e suor, para a minha surpresa, veio a resposta.

"obscura escrevedora/hábil sonhadora, eu gostaria de ser o teu analista. para te fazer ver que tu és uma personagem", dizia no email. 

depois dessa, adormeci. sonhei que walter tomava valium para dormir. e achei isso super coerente. escrevi a respeito sem usar um parêntese sequer.

encontro com walter

chegou vestido de preto. todo de preto. terno e sapato social. estranhei. desde sempre foi meio hippie, maloqueiro até. sentou do meu lado na mesa. sorriu pra mim. e comecei a conversa. "o que achaste?", perguntei. "achei um tanto ininteligível", respondeu. "como assim?", perguntei. "não entendo o que tu escreves. acho que não entendo. fico em dúvida", respondeu. eu não entendi se a dúvida era sobre o teor dos meus escritos ou se era sobre o fato de não entender. fiquei muda. percorri as paredes com os olhos. achei brega um pôster do van gogh emoldurado de dourado, com paspatur azul. eu quis acender um cigarro, mas era proibido dentro no bar. eu quis ir pra rua, mas previ que walter não me acompanharia. fiquei ali. não gostei do relógio da pepsi pendurado na parede. e também da luminária em forma de castiçal. na pista começou a tocar stones. sympathy for the devil. tirei walter para dançar. "está muito frio pra dançar", foi o que ele respondeu. depois dessa, bebi mais uma dose de gim. percebi que, da mesma forma como escrevo, começo os encontros sem ter a menor idéia de como chegarão ao final. simplesmente vou. sou ousada. "eu gostaria que tu escrevesses algo sobre os meus escritos. algo simples. só para mim", cutuquei a onça. walter coçou o olho e suspirou. meu pedido pareceu um fardo. "vou ver o que posso fazer", respondeu. depois dessa, tive certeza de que tomaria uma terceira dose de gim. meu pai disse que gim é o fim da linha. pois bem, eu queria mesmo chegar lá. "estou atolado de trabalho. duas encomendas pra site e provas dos alunos pra corrigir", walter comentou para me sensibilizar. "que bom, hein. eu continuo escrevendo a esmo, pra ninguém ler", comentei para sensibilizá-lo. "isso é bom. o descompromisso liberta", disse ele. "verdade. mas não aguento mais almoçar sanduíche", eu disse eu. "estás vendo? esse tipo de texto que acabaste de falar é que me intriga nos teus escritos", disse ele. "caralho, walter. tu não consegues fazer a ponte entre causa e consequência?", falei. "boa. outra tua", falou. "não me oponho à narrativa. só que meu foco é escrever", falei. "se tivesses feito a graduação em letras te darias conta das besteiras que falas", atacou. "se tivesses feito a graduação em artes entenderias os meus escritos", ataquei. "tu cometes erros crassos. confundes o mais básico. o que te salva é a tua imaginação", retrucou. "justamente o que te falta como leitor", retruquei. walter emudeceu. percebi que ele fazia o mesmo que eu nessas horas, lambia as paredes com o olhar. "gostei da decoração", disse ele. "vai te cagar, walter. antes que tu te esquentes e possas dançar", terminei a conversa.

mínima ficção

acontece em potencial. só em potencial. há pouco tempo para imaginar. o mundo está cheio de coisas efetivamente acontecendo. estamos ocupados. os romances mofam nas estantes. a vida vive sem eles. importa descascar batatas e ir ao banco. 

ninguém usa óculos. a mancha do mofo passa despercebida. nenhuma rinite iminente.

noção

não tinha nem amanhecido. era noite no meu coração.  por isso não me despedi nem me casei contigo. só me restou essa noção. estava muito cedo quando partiste.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

escreva

escreva todas as maluquices que te vierem à cabeça. não julgue, não filtre, não intervenha de modo que não seja escrevendo. isto não é impresso. isto não é perene. isto não é um livro. dá para mudar e excluir. e quase ninguém lê. quem lê não espera nada, zero expectativas. quem lê está aqui por acaso. por conivência. ou por conveniência. para passar o tempo ou os olhos. para brincar. ou para deixar de fazer algo útil. o importante é que isto não é importante. e quanto menos importante, melhor para a tua fluência. vai por mim. te joga escrevendo. quando te deres conta são as palavras que escrevem.

Há domingos e domingos,

dizia o sábio chinês que morava no vale dos findes. Só acreditei nele num agosto sem feriados. 

o cara espirrou

o cara espirrou como quem pare um filho. o som ecoou nas paredes do restaurante. estilhaços de ranho em cima da mesa. a vela apagou com o bafo. todo o romantismo do primeiro encontro foi tragado por aquele nariz úmido que se recompunha daquele ato inábil e desordeiro. fiquei com pena mas o nojo foi maior. quando ele me pediu desculpas eu disse que seria difícil. e ele me chamou de indelicada.

nessa manhã de domingo imortal

Fiz feijão. Arranjei flores pra suprir o vaso chinês, vazio há tempos. Perfumei a casa com incensos. Abri todas as janelas. Botei o tapete no sol, entre o portão da rua e a porta de entrada da casa. Estendi a rede na varanda. Preparei um chá gelado de hibiscus. E limonada com hortelã, pra a hora do almoço. Pus um vinil do Cartola no toca discos. Vesti a saia de renda e soltei os cabelos. 



Tu vens chegando pra brincar no meu quintal.

ref. Alceu Valença, Anunciação.

o dia surgiu

o dia surgiu vetusto. algumas horas apodreceram. outras se perderam. só deu tempo de tomar um nescau e voltar para a cama. o dia foi domingo. domingos são os mais perecíveis. 

hoje eu vou escrever

Hoje eu vou escrever pelo meu fugaz enjoo de ler. E pelo emocionante motivo de que vivi instantes narráveis há não mais que 12h. Sim. É isso.

Pois bem. Cheguei de viagem e a rodoviária estava lotada. Mas eu não conhecia ninguém. Aquilo me causou imensa paz. A respeitável sensação do eu-alienígena. Tudo zerado na minha vida. Pude fumar sem ser interrompida. Sentei no banco dos taxistas - nessa cidade os motoristas de táxi têm um banco de praça, do lado externo do prédio, especial para esperar os passageiros que aparecem em intervalos consideráveis. Pouca gente anda de táxi aqui. O transporte coletivo é sofrível. Todos têm carros. Município pobre. Lembrei da tarde de sábado como quem aprecia um vinho encorpado. Cabernet Sauvignon. Sábado encontrei velhos amigos velhos (sim, velhos-velhos). Vi meu pai feliz e minha mãe mais alegre que o habitual. Eu enxergava as caras deles e as dos velhos amigos velhos sorrindo pra mim no reflexo dos vidros dos táxis, e não entrava em nenhum. Estava bom ali. Aquele banco de praça fez as vezes de poltrona de cinema. Mas eu não estava totalmente em paz nem imersa na película. Ansiava que algum taxista viesse me repreender por estar ocupando um lugar alheio. Eu estava disposta a brigar, para dissipar a irritação que me acomete depois de 4h dentro de um ônibus. Mas não. Ninguém veio. E isso me irritou ainda mais. Pensei em ir para casa a pé, em dar o calote no taxista, em mentir meu endereço. Mas não também. Terminado o cigarro, acendi outro - foi o máximo que eu fiz. Depois entrei num táxi apertado. Igual àquele fusca contemporâneo eu nunca tinha visto. Tão pequeno que eu encostava os joelhos no banco da frente. Tão ereto o banco de trás que quase vomitei. Endereço correto e corrida paga, cheguei em casa. Tudo estava no lugar, dispensando placas de privacidade. Voltei a ser aquela. Abracei os cachorros como uma verdadeira madona. Enxerguei no sofá da sala o meu banco de praça. E liguei a tevê.

terça-feira, 9 de julho de 2013

( )

Não sei mais escrever. Desaprendi. 

Antes o texto saía como música. Vinha um rock, um reggae, um samba, um vivaldi. Agora não. Tenho de pensar. E para escrever penso no que me aconteceu para que esse parêntese vazio me acometesse... Tenho passado dias inteiros lendo. Às vezes lavo roupa. Ou cozinho. 
Pouco trabalho. Menos ainda acontece e minto. 






Por ficar ao léu resfriei. 


Aganjú. Carlinhos Brown.




   

tralhas

Estão querendo me enganar. Rir de mim. Gozar. Disseram que seria privado, que seria protegido. E dominável. Mas não. Apareço em 300 páginas. Com a cara de louca que nem tenho mais. Com discursos que nem acredito mais. Pensei em trocar de nome ou me excluir dessas tralhas todas. Sim, tralhas - o obsoleto em forma e sentido. 


     

sexta-feira, 5 de julho de 2013

anita

a criaturinha se chama anita. já veio com esse nome. e já veio encantada. não se impôs nem se omitiu. evitou antipatias. veio neutra como uma samambaia - elemento oxigenante, comparência profícua. porque pecinha viva e capaz. com o tempo tomou seu posto. remoldou as bordas do código e do espaço. mostrou os dentes e o resto. mas só quando já estava dentro. e para sempre até que seja. anita é presença.




a (alta) auto-estima do belot reaparece nos olhos úmidos dessa cadela pra eu dar risada. 
um bicho inteligente nunca é humilde. magnanimidade é coisa de humano. estou enganada?

antes

Antes que digam qualquer coisa, eu direi o que me antecipa: não

Com a referência desse "não", me meçam. Aí pode ser que eu concorde e ande junto. Mais devagar. 







Eu não ando rápido porque tenho pernas curtas. 
Eu ando rápido porque busco meus pares. 

Carlota Joaninha

síndrome



Síndrome de Bartleby 


[since 18/05/2013]










"E perguntar-me por que não escrevo inevitavelmente desemboca em outra inquisição muito mais inquietante: por que escrevi? Afinal de contas, o normal é ler."

[Vila-Matas, Enrique. Bartleby e companhia.  SP: Cosac & Naify, 2004. p.43]

quinta-feira, 27 de junho de 2013

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: ela é uma pensadora

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: ela é uma pensadora: pensa no mato sem cachorro, na morte da bezerra, na volta do bumerangue, na força estranha da formiga, na poeira que flutua invisível, na fu...


pensa no mato sem cachorro, na morte da bezerra, na volta do bumerangue, na força estranha da formiga, na poeira que flutua invisível, na fumaça que sobe às barbas do vento, na circunferência da ervilha, no raio do ovo galado, na tonga da mironga, na desmatéria do ritmo. 

(e acha tudo à fudê).

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in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: exaustera: se jogou no mar e nadou até a rebentação. depois do estouro das ondas só havia calma. surpresa boa. emoção masinha. gosto azul na boca. dese...


se jogou no mar e nadou até a rebentação. depois do estouro das ondas só havia calma. surpresa boa. emoção masinha. gosto azul na boca. desejou acariciar o horizonte. e boiou nas águas serenas com gratidão. 


não mais cansaço, não mais dureza. 

era só a linha móvel que dividia o mar do resto.  

terça-feira, 4 de junho de 2013

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in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: Disse: Disse que não lavaria mais as minhas calças de abrigo. Disse que da próxima vez que encontrasse na tulha aquele trapo puído, desbotado, féti...


Disse que não lavaria mais as minhas calças de abrigo. Disse que da próxima vez que encontrasse na tulha aquele trapo puído, desbotado, fétido, encardido, o jogaria no lixo. E eu achei isso um ato de terror.

Disse para eu não comer mais margarina. Disse para excluir da dieta aquela gordura hidrogenada interesterificada, corada e aromatizada artificialmente pelos nocivos Cs e Ps, composta de ácidos sulfúrico, benzóico e butil hidroxitolueno que em nada ficavam atrás da soda cáustica. E eu achei isso explosivo.

Disse que a ordem dos cds estava trocada. Disse que embora eu não entendesse qual, a sua arrumação tinha um critério - subjetivo, mas tinha -, que havia passado a juventude inteira investindo naqueles tesouros - tanto que não virou  alcoólatra e ainda conseguiu decorar o lugar de cada um na fila - e que portanto devia ser respeitada (a ordem ou ela?, não entendi qual). E eu achei isso confuso.

Disse, com cara de mais boazinha, que cuidaria de mim e que eu cuidaria dela. E não disse mais nada. Eu acho que isso é amor.  

sexta-feira, 31 de maio de 2013

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: vejo [I]

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: vejo [I]: No teu jardim de margaridas, vejo orquídeas muito bonitas.

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in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: o velho: a rua estava deserta e silenciosa. dava pra ouvir o apito do trem. o velho caminhava na calçada com uma tesoura no bolso do paletó. fatiota ...


a rua estava deserta e silenciosa. dava pra ouvir o apito do trem. o velho caminhava na calçada com uma tesoura no bolso do paletó. fatiota xadrez. parava em frente aos muros das casas - muros baixos de interior. olhava ao redor e limpava o suor da testa com um lenço de seda, fúcsia. empunhava a tesoura, num suspiro de pesar, e cortava flores de árvores e arbustos. montava um buquê. pra dar pra velha. 

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: quando dei por mim

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: quando dei por mim: eu rolava na grama. mantinha os olhos fechados e a boca aberta para morder o capim. nadei na terra. esfreguei o nariz no sereno, verde-branc...



eu rolava na grama. mantinha os olhos fechados e a boca aberta para morder o capim. nadei na terra. esfreguei o nariz no sereno, verde-branco orvalhado. removi pedras buscando o cheiro. alcancei raízes firmes e cavei. mastiguei minerais. sorvi água morna e rolei um pouco mais. umedeci. o calor dissipava. meu coração batia na mesma proporção, desacelerando. lati. eu era um cão.

terça-feira, 21 de maio de 2013

de volta às (artes) visuais

Só fará sentido se for quadrado. Falta preto. Deixa escorrer. Tem que ficar mais para a esquerda. Precisa secar. O azul saturou. Não gostei do amarelo. Achei o ponto. Mais um pincel perdido. Queria um tanque de alumínio. Agora é só esperar. Esqueci o café na estante de livros. Faz dois dias que não uso óculos. Vou tirar as arestas. Está quase. Um alongamento vem bem. Deve ter no estojo. Que bom que vingou. Não vi anoitecer. 



sábado, 18 de maio de 2013

nossa senhora

Nossa Senhora do Alvejante Sem Cloro, 

dai-me forças para carregar a tulha;

dai-me ânimo para vencer a pilha;

dai-me um dia de sol.


sexta-feira, 17 de maio de 2013

lado cão


Gosto de andar em bando e trabalho muito bem em equipe. Minha visão é ótima mesmo na penumbra. Sou avessa à luz forte. Meu olfato não foi afetado pelo cigarro, decifro cheiros a metros de distância. Sou exigente com perfumes. Escolho o suco pelo cheiro (e a cor). Meu paladar é rudimentar, aceito qualquer coisa que não respire. Sou louca por carne gorda e tenho restrições a folhas. Posso passar um dia inteiro dormindo ou um dia inteiro correndo. Corro pra rua quando ouço barulhos, não tenho grandes medos. Mas, desde que passei a morar sozinha numa casa, tenho o hábito de pendurar sininhos ou quizos nas portas e janelas. Para que eu as ouça quando são abertas. Meu lado cão é imperioso.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

meus abrigo

Meus abrigo furado que todo mundo odeia são os mesmos 
abrigos de plush que me abrigam nas horas vazias e cheias. 




chafariz

naif feito um chafariz:




feliz feito um chafariz!


.
nariz feito um chafariz..


quinta-feira, 9 de maio de 2013

2001:

2001:Uma odisséia na gaveta 



dos papéis velhos.



calendário (2001)

segunda chorei por ti.
terça fiquei mais calma.
quarta torci por mim. 
quinta reguei minha alma.
sexta esqueci de tudo.
sábado me diverti.
domingo caguei pro mundo.

segunda senti raiva.
terça me revoltei.
quarta tive idéias.
quinta compartilhei.
sexta fiz muitas coisas.
sábado comemorei.
domingo dormi cansada.

e no feriado despertei.

terça vivi.
quarta voei.
quinta sorri.
sexta amei.
sábado, nada.
domingo não sei.

um homem que não eras tu (2001)

Sonhei com um homem que não eras tu.
Senti por ele um desejo descontrolado.
Bem quando ele ficou pelado
acordei ao teu lado e tu estavas nu.

Por ter te traído, fiz as malas.
Enquando dormias, parti.

Antes de bater a porta,
mirei na foto nossas caras
sorrindo por tantas horas.

Qual das duas era eu?
(a que sorri ou a que vai embora?) 

Em nenhuma delas me reconheci.



meta (I)

Meta: escrever algo estimulante pra essa gente que não têm preço.

"Antes das férias se ganha mais um terço".

amor V (2001)

amor violento
amor virou lento
amor virulento

amor que nem tento

quant (2001)

Quanta bobagem cabe num copo de cerveja?
Quanta certeza há na percentagem?

Quanto desejo lateja em quem beija?
Quanto se aprende em cada viagem? 

sina (2001)

Ônibus lotado,
corpo cansado e um balanço que nina. 

Chega atrasado, sempre atrasado.

Eis sua sina.

fundo do poço (2001)

No fundo do poço
tem uma mola,
que te impulsiona
e te joga pra fora.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

O Encontro



Essa mulher existe inobstante somente eu a veja. Quando aparece, ilumina o caminho. E o entorno deixa de ser aquele. Tudo abranda, dissatura. Uma espécie de luz a permeia – ela parece estar prestes a se desmanchar no ar. Mas não. Ela é feita de carne e tempo, sua matéria é igual a minha. Ela é só uma mulher. Mas sim (e tem gente que duvida).

Velha. Idade indefinível. Mãos brancas com veias salientes, azuis. Mãos que já escreveram muito e que talvez por isso exibam veias assim, dilatadas, desenvolvidas, envolventes. Se romper uma dessas mangueiras vitais, jorrará um caldo azul royal que pintará o mundo. Para sempre. 

Na primeira vez em que a vi, ela estava sentada num café muito charmoso na Rua Morom. Vestia preto e anotava coisas num pequeno bloco estampado de flores. Tons berrantes que não combinavam com ela. Acho que ganhou de presente, o bloco. 

Sentei à sua frente, em outra mesa. Não pude deixar de notar aquela figura de tez extraordinariamente pálida, rugas sinuosas que pareciam desenhadas à nanquim, cabelos grisalhos presos numa trança em coque, corpo magro porém vigoroso. Usava óculos e batom claro. Fumava. 

Minha vontade de fumar só não foi mais forte que a vontade de falar com ela. Sem cerimônia nem licença, pedi-lhe um cigarro. Ela me alcançou um maço de Charm e um Zippo dourado. Luxo. 

Logo que dei a primeira tragada, em pé, ela me convidou para sentar à sua mesa. Disse isso fechando ternamente o bloco estampado. Aceitei o convite e me instalei tão perto dela que dava para sentir o seu perfume. Amadeirado e discreto. 

A princípio, a mudez da anfitriã me perturbou um pouco - nenhuma palavra para quebrar silêncio, nenhum gesto para preencher vazio. Acatei o silêncio. Cerca de dois minutos nisso, ela começou a falar. Disse ser escritora, que publicava livros desde 68, todos sob um pseudônimo. Contou que nasceu no Chile, de pai austríaco e mãe polonesa, ambos professores, e que veio para o Brasil ainda bebê, cresceu no Rio de Janeiro, estudou em Porto Alegre e mudou-se para cá, onde casou e viuvou. Contou que durante a ditadura militar teve de ocultar a verdadeira identidade, para sobreviver em todos os sentidos - escrever e respirar -, e que mesmo com a Abertura manteve o pseudônimo porque seu nome de registro havia morrido de exaustão. Depois, ela apenas quis saber de mim. 

Falei feito rádio, enquanto ela me ouvia, plácida e interessada. Sem me interromper, empática como uma mãe, teceu breves e estranhos comentários:

- Tu desenhas enquanto falas. Isso é coisa de escritor. É inócuo resistir – comentou tragando o primeiro cigarro. Admirei sua convicção.
- Tu pareces uma menina. Talvez a vida ainda não tenha te dado pedras bastantes para te esfolar. Quem sabe és tu que terás de buscar as pedras – comentou apagando o terceiro cigarro. Percebi sua perspicácia.
 - Tu te expressas muito bem para uma pessoa com tantas hesitações. Forma e conteúdo têm de pelear para encontrar o passo adiante. Isso é formidável. Demasiadamente humano. Sedutor – comentou acendendo o quinto cigarro. Desejei ser sua amiga.
- Tu deves errar mais. Errar é profícuo. E é o único jeito de existir. Verdadeiramente – comentou puxando do maço o último cigarro. Senti que nos tornamos amigas.

Saí do café só depois de vê-la ir embora. Precisei de quase uma hora para processar o encontro e refazer meu trajeto. Desisti de ir ao banco. Deixei o cinema para outro dia. Não passei na padaria. Fui direto para o sofá de casa, ler meus pensamentos, que estouravam no teto e escorriam pelas paredes, almofadas, meu corpo estirado entre almofadas e os livros da estante. Tudo boiava. Mareei. Os polos foram mexidos. O magnetismo dessa mulher que existe, inobstante somente eu a veja, é implacável (e tem gente que duvida).

quinta-feira, 18 de abril de 2013

guria do mato

nasceu numa casa de geografia improvável - era como um trem que adentrava o pátio. brincava entre as àrvores, criava hospitais de formigas, fazia enterro para passarinhos caídos. depois viveu numa casa de geografia transparente - tantos vidros traziam o jardim para dentro de casa. domava cães, cultivava pedras, aventurava-se no desenho botânico. daí foi morar na caverna. forrava os tetos com samambaias, emoldurava as portas com gibóias, plantava marias-sem-vergonhas em louças sanitárias. eis que foi morar na torre, onde Nada brotava. ansiava pisar no solo, rolar na grama e soltar os bichos num espaço com horizonte. e o fez. foi viver na casinha encantada. transplantava inços para vasos, colecionava seixos, tratava árvores antigas. até que foi estar na casinha azul. acompanhava musgos que habitavam as paredes chapiscadas, insetos que habitavam a madeira perecida e minhocas que habitavam a terra argilosa. e foi parar na casa da rua com nome de santo! semeava terra preta em pratos de barro, desvendava aranhas, amanhava canteiros e tudo o que mais houvesse, a guria do mato.              




[Amanhar. v.t. Cultivar, preparar, tratar.]

quarta-feira, 17 de abril de 2013

morou em tanta casa que nem se lembra mais

Ela sai de uma casa para viver numa melhor. Como se fosse massinha de modelar, ela busca ser moldada e fundida - para, assim, ser acoplada num espaço de abraços. Bem assim e fodida

A casa melhor casa com sua pesquisa.


Só isso.

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in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: tento: tento inventar uma mentira interessante para escrever aqui. mas nada fantasioso me ocorre nesta manhã cinzenta. é a força da realidade que a...

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: teto

in_o_ & aqui_o_ ◄ clique pra voltar: teto: o desenho do mofo parece aquarela. a rachadura, nanquim.  e o prego, uma estrela.

terça-feira, 16 de abril de 2013

outros olhos e sintos [para pf]

Hoje passeei por pf com outros olhos e sintos. 

Estou começando a gostar da cidade.


Consegui rir do trânsito, da sua concepção singular, egoistamente regional - lombas tríngremes que desembocam em sinaleiras fechadas ou numa placa de pare para não matar ou morrer, mãos únicas repentinas e improváveis, semáforos antipáticos à moda ampulheta, motoristas mal educados ouvindo música sertaneja (no volume máximo), faixas amarelas vetadas a qualquer parada, absoluta inexistência de vagas para estacionar.


(Minha descrição do trânsito de pf alcança, pela primeira vez, um certo grau de compaixão. Eis um começo - e pelo que mais detesto: o trânsito. Eis a purga - e o resto: o encontro.


G. Freud talvez dissesse que esse começo aconteceu (acomeçou) porque estive numa livraria. E porque completei o ritual: andei em câmera lenta lendo as lombadas todas, sem saber o que buscava e encontrei! - livros raros, edições esgotadas, Manoel de Barros e um desconhecido no qual esBarrei. 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

quarta-feira, 3 de abril de 2013

pílula de sabedoria [III]

Quando te sumirem as palavras ou te resignares com uma da qual duvidas,
estarás verdeiramente sentindo. E/ou com o "foda-se" ligado.

sábado, 30 de março de 2013

pílula de sabedoria [II]

Existe é exagero de zelo. Exagero de amor, por bicho ou gente,
não existe. O amor não tem limites. E independe do objeto. 






 Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Fernando Pessoa.

pílula de sabedoria [I]

Se continuares bebendo desse jeito toda vez que morre alguém 
que tu amas, morrerás antes dos alguéns que tu amas. 
E não haverá trago no teu velório lotado.

Amigas,

Amigas,

Estou tão triste. Parece que vou implodir. Sinto uma falta de vocês que não sei como explicar. Ou escrever. Não citarei nomes, porque sei que vocês sabem quem são. Minhas amigas. Ressalvo que não as vejo como um bolo, uma massa. Reconheço e sinto a falta de cada pedacinho isolado de cada uma de vocês. Vejo suas carinhas na minha memória, que hoje está em sépia, combinando com o outono. 

Essa falta que eu sinto não se chama saudade, tem outro nome, não sei que nome tem. A tristeza esvaziou meu vocabulário, roubou minhas palavras companheiras. Está difícil encontrar um discurso que exprima o montão de coisas que quero dizer a vocês, especialmente sobre o teor dessa falta que aparece tão nítida na dor, como acontece com qualquer ser humano egocentrado e frágil - e talvez por isso mais humano. Está difícil abstrair, então me restinjo a descrever: 

escrevo com o note sobre a mesa da sala, a tv está ligada no Jornal Nacional, B2 está deitado na caminha dele, acordado, e há pouco veio me cheirar, enquanto B1 dorme o sono profundo de quem deseja a liberdade azul - tudo sob a luz cálida daquele abajur romanesco que eu tinha no escritório da casinha encantada.

Não sei até quando poderei viver essa cena, nós três, os mosqueteiros, juntos, numa noite de outono. Talvez essa seja a última. E talvez por isso eu sinta a falta de vocês como nunca.   


Beijos vertidos para sempre 
(pois eternizei esse momento), 
C.


PF, 26 de março de 2013.







[foi mesmo a última noite]
Belot (15 de novembro de 2002 - 27 de março de 2013.



http://www.orkut.com.br/Main#Profile?uid=3177187200801481312

terça-feira, 26 de março de 2013

exercício - pontuação ao sentir

não existe nada mais cansativo que sofrer. como outros já disseram, depois da tristeza vem (e vem mesmo) o cansaço. junto com um sofrimento que não mais se traduz por "tristeza". tem outro nome. não sei que nome tem. "sufocamento", talvez. "melancolia", talvez, também. 

está difícil respirar. meu cachorro está morrendo. o cachorro que mais amei dos tantos que tive. só agora percebo a força do afeto que deposito nesse Cão. é uma montanha de amor! donde lá de cima vi a vida tantas vezes... e ri tantas vezes de coisas banais, insólitas e até idiotas. e chorei tantas vezes por coisas banais, insólitas e até idiotas. 

depois de idas e vindas emocionais, escolhi a gratidão. estou fazendo de tudo para que seus dias finais sejam bons. eu canto, eu danço, eu cozinho pra ele, eu limpo o jardim, eu corto os cabelos. eu busco a leveza. e agradeço. sempre.


existe exagero no amor por um cão? acho que não. existe exagero de zelo, e só. exagero de amor, por bicho ou gente, não existe. o amor não tem limites. piegas? é. mas é. sem limites. eu acho que sim e espero continuar achando. 
por toda a minha vida. 

sou grata pela oportunidade de tê-lo em minha vida. e também sou grata por esse imenso amor que sinto. 

segunda-feira, 18 de março de 2013

o que não mata fortalece


envenenaram o meu cachorro. sim, é isso mesmo que vc acabou de ler. foi isso mesmo que ouvi do veterinário - diante dos exames e circunstâncias, era a explicação possível. como? quem? por quê? mas vendo aqueles olhos tristes, anêmicos e agonizantes, eu só sentia medo. depois, entendi com todos os meus sentidos a frase de mestre heuser "odeio a humanidade, eu gosto é de indivíduos". e, mais depois ainda, penso que entendi o desejo de quem compra uma arma. sim, é isso mesmo que vc acabou de ler. mas... passados outros depois, a duras penas, para não cultivar ódios e mágoas, optei pela gratidão. meu cachorro sobreviveu (melhor, está sobrevivendo) - agradeço à deus e à ciência, ao cosmos e ao veterinário.

não quero saber quem fez nem por que, e não me darei ao trabalho de tecer comentários morais a respeito. termino esse post dizendo apenas que é madrugada e que estou escrevendo para poder dormir! - numa cama improvisada ao lado do cachorro, que respira bem e até já balança o rabo. 


O que tu fizeste daquilo que te fizeram?  Sartre[?]

sexta-feira, 8 de março de 2013

(o meu brinquedo de estar)

 http://www.youtube.com/watch?v=TB6Cpy-X7A8&feature=share


http://www.youtube.com/watch?v=jfw7XVkLqlY


é mais difícil não

é mais difícil não fumar quando chove. 

é mais difícil não dormir aos domingos. 



bem melhor

cansei de ser sexy, inteligente, espirituosa, divertida, interessante, corajosa, sensata, generosa, forte, disposta, leve, perfumada, agradável, alegre, conveniente. cansei de não ser eu. e é por isso que me tornei melhor.

então

estou cagando para com-quem você dorme. cago para quem você come. se mulher ou homem. se gata ou gato. se cachorra ou cachorro. só quero ser sua amiga, sua colega, sua vizinha, sua parceira. para tanto, vejo apenas, do seu pensar e agir, a sua maneira. 


quarta-feira, 6 de março de 2013

a vida é

esquina. ponte. comida. maçaneta.
telhado. pedra. janela. caneta.
ônibus. parada de ônibus. bicicleta.
computador. jardim. dinheiro. televisão.
mala. espelho. telefone. café. chinelos.
cadeira. caneca. picolé. nuvem. chaveiro.
muro. mato. bicho. filho. vizinho. martelo. chuveiro.
tinta. vassoura. chiclete. calçada. caramelo.
concha. colcha. cama. relógio. travesseiro.




(em todos os sentidos e nenhum)

para registro

para registro: os três textos abaixo foram escritos corridos num tempo que pra mim foi outro. pela regra comum, 3 min entre o primeiro e o segundo, 2 min entre o segundo e o terceiro. para mim, 3 dias e 2 horas. estranho isso.



(continua...) postado agora pra não perder o lugar na fila




O tempo é universal. A percepção do tempo é singular. 

Se a única realidade que temos são os instantes percebidos, 
o resto passa perdido e não interessa o final.  

ares

A mulher com ares de pesonagem do Woody diz pra outra: "Quem te criou foi Pedro".  Esta não diz nada, só traga o cigarro e ri - enquanto a primeira ajusta a fivela da sandália pela décima terceira vez.

Estão numa mesa de bar, numa noite de inverno. Sábado de madrugada. O bar está cheio. Música alta. Dá preguiça conversar. Passam o tempo observando as pessoas em volta da mesa que mais é uma tela iluminada. Há dois lugares vagos nessa tela. Elas anseiam completá-la. Como um álbum de figurinhas. Estão valendo até as repetidas.

Já tocou de Janis a Maria. Nada acontece por cerca de duas horas. As mulheres pegam suas maxi bolsas e vão embora. 

Em suas casas, dormem. A primeira, com um pijama de flanela. A segunda, com um baby-doll de cetim. E lá, na tela iluminada, sentam dois caras. Um com ares de personagem do Wong. O outro criado por Win. 





Há dois lugares vagos na tela. Eles anseiam completá-la. Como um álbum de figurinhas. Não valem as repetidas.  
     

minto

minto porque gosto de inventar. não tem nada a ver com enganar. 



tem a ver com fabricar. 

escrever. 

ainda que falso e vão. 

faço.

gorda

só percebeu que estava gorda quando se viu refletida no vidro da vitrine. vendo-se gorda, entrou na loja - a fim de chancelar a conclusão, tirar a prova, pôr o pingo no "i". escolheu quatro calças jeans. entrou no provador hiperiluminado. visualizou no espelho sua imagem rechochuda e nua. dectectou celulites - novas celulites. lamentou em silêncio, como guardando um segredo. vestiu a primeira peça. abominou sua bunda. desvestiu suspirando. vestiu a segunda. execrou seus culotes. desvestiu murmurando. a terceira não entrou. e na quarta percebeu a barriga - nova barriga. desvestiu gargalhando. alto. porque gostou do que viu das costelas pra cima! peitos fartos e ombros largos. corada. sem rugas.

foi embora satisfeita. não levou nenhuma calça, mas chancelou a conclusão. e comprou quatro blusas. 


sexta-feira, 1 de março de 2013

quando dei por mim

eu rolava na grama. mantinha os olhos fechados e a boca aberta para morder o capim. nadei na terra. esfreguei o nariz no sereno, verde-branco orvalhado. removi pedras buscando o cheiro. alcancei raízes firmes e cavei. mastiguei minerais. sorvi água morna e rolei um pouco mais. umedeci. o calor dissipava. meu coração batia na mesma proporção, desacelerando. lati. eu era um cão.







quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

a vizinha

a vizinha passa todas as manhãs falando da vida dos outros. do novo emprego do filho da amiga, da safadeza do cunhado, das dívidas da enteada, da saúde da colega de ginástica, da casa suja e cara da comadre, do carro novo do namorado da filha do primo distante, da promoção com salário dobrado da irmã da mulher do primo distante que tem o genro de carro novo. 

a vizinha passa todas as manhãs reunida com pessoas, no pátio da sua casa, tomando chimarrão e falando. vêm gente de todo canto, para provar sua erva e ouvir suas histórias. é só ela quem fala. sua voz é grave e forte, encorpada. de longe dá a impressão de que ela está palestrando, mas basta atentar para o assunto para perceber que não. é fofoca mesmo. e que público interessado! não se ouve um suspiro! mas se intui aplausos. 

perto do horário do almoço as pessoas vão embora. ouço os "até logos" e o barulho dos carros. a vizinha não convida as pessoas para almoçar. ela almoça sozinha. 
  

eu hoje passei a manhã escrevendo sobre a vida da vizinha. em silêncio e sem platéia. 




terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

se você

se você pensa que vai fazer de mim o que faz com todo mundo que te ama, acho bom saber que não. se você disser que eu desafino, amor, eu gritarei mais alto.


(se você pretende saber quem eu sou, saiba que eu também).

o velho

a rua estava deserta e silenciosa. dava pra ouvir o apito do trem. o velho caminhava na calçada com uma tesoura no bolso do paletó. fatiota xadrez. parava em frente aos muros das casas - muros baixos de interior. olhava ao redor e limpava o suor da testa com um lenço de seda, fúcsia. empunhava a tesoura, num suspiro de pesar, e cortava flores de árvores e arbustos. montava um buquê. pra dar pra velha. 

puxa vida

dia sem chuva nem nicotina. sensação térmica de 40°C. implodo. incendeio e viro pó. é minha quarta-feira de cinzas. veio numa quinta, nove dias depois do carnaval.

kabuletê

emoção que regozija, oh. estesia? sei lá da tonga. e da mironga. 
só sei que esse kabuletê é bom.








quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

voltei a ouvir

voltei a ouvir pedro veríssimo. caminho a esmo por ruas horrorosas e as acho bucólicas. me pego contemplando um mosquito num vôo tonto. não ouço o trânsito. 




Sendo um pouco como o vento.

eu quero que chova

Eu quero que chova.

Para não recolher as roupas. Vê-las encharcar e escorrer. 

Para não sair de casa. Para ver nascer caminhos d'água. Para molhar a grama amarelada. Para varrer as folhas do telhado. Para mergulhar as britas cagadas. E ver o incinho emergir.

Para ninguém passar na calçada. Para saber da cidade vazia. Para escrever e nada.