terça-feira, 8 de janeiro de 2013

No Meu Tempo [fofolete x Polly]

No meu tempo, nós, meninas, brincávamos de fofolete - bonequinha de seis centímetros, cabeça de plástico e corpo de pano recheado de bolotinhas indefiníveis (sagu?). Corpo fofinho nos dois sentidos. Hoje há a Polly (com p maíusculo) - bonequinha de seis centímetros, toda de plástico siliconizado. Corpo magérrimo, esquálido.

A semelhança, creio, não passa do tamanho. Para começar, a fofolete sequer tinha nome: fofolete era gênero. Aqui "não ter nome" significa ter qualquer nome, o nome que, naquele dia ou para semppre, a sua dona ou amiga da sua dona e manipuladora a batizou. A fofolete não tinha acessórios - sua casa era feita pela própria brincante, com caixinhas de fósforo, tampihas de garrafa, vidrinhos, carretéis. Um luxo era ter mobília feita por algum merceneiro, geralmente pecinhas de madeira que se encaixavam. Seu guarda-roupas resumia-se a uma touca e um cachecol. Portanto, mesmo com aquele corpinho de pano, era como se vivesse pelada. A  Polly tem dezenas de acessórios, e tem casa, piscina, moto, carro, helicóptero. Tem um vasto guarda-roupas especial, fashion e de plástico. Portanto, ela vive "montada". 

Com a fofolete, a brincadeira começava antes, na confecção de seu cenário, seus objetos, seu universo. E o desenrolar da bricadeira, com a criação de enredos, situações, relações entre fofoletes, comumente era alimentado pelo ambiente criado. Com a Polly, a brincadeira começa na mera organização de seus incontáveis acessórios, rapidamente, para já começar a troca de roupas. Também há tramas e relações, mas isto não é o cerne da brincadeira - trocar tantas roupas envolve muito tempo.  O cerne dessa brincadeira é combinar figurinos, embelezar-se, "montar-se" para... o quê, mesmo? Bom, isso não importa tanto. Então, vamos andar de helicóptero.

Vejo nisso um retrato da diferença entre as gerações. Prezava-se o fazer manual e o entorno imaginado, com todas as possibilidades oferecidas pela ausência - terreno da criação. A fantasia reinava sem limites. Hoje, na verdade, estou muito crescidinha para saber até onde vai a fantasia. Posso estar sendo romântica ou presunçosa, mas, se ela vai até algum ponto, é porque tem limites. Logo, ainda reina, mas sem domínio absoluto, dentro de uma circusncrição - comarca do poder de consumo, âmbito do ter e do estar o mais bonita possível com aquilo que se tem. Ser fica em segundo plano. 

Inobstante isso, minha filha me pede uma Polly com acessórios - e eu compro. Vejo no corredor do caixa umas bonequinhas denominadas "fofolete", parecidas com as antecessoras, mas sem o mesmo charme. Perfumadas e com cores fluorescentes, cabelo bem mais volumoso, sem touca e sem cachecol! - e não compro. 

Porque o mundo da minha filha é hoje. Aquele meu mundo foi ontem, No Meu Tempo.

        

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