terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Zelda

Zelda já fez de tudo: dançou balé, tocou piano, roubou um estojo de canetas hidrocor numa loja de departamentos, colou na prova do vestibular, formou-se em Direito, trabalhou em escritórios de advocacia, estudou teatro, fez cursos de mergulho, pintura, oratória e desinibição, comprou um apartamento, trocou o apartamento por uma casa velha, criou cachorros e uma tartaruga, alimentou os gatos da vizinhança, fez doação para o Criança Esperança, viajou de ônibus até o nordeste, viajou pela Europa de mochilão, aprendeu a tocar violão, foi cantora de banda de rock e crooner de banda de baile, atuou num filme em super-8, namorou um colorado, casou com um gremista, deu para vários caras, transou com uma mulher e não gostou, leu Paulo Coelho, Hesse, Bukowski, Cortázar e Guimarães Rosa, queimou um livro sobre o poder do subconsciente, vendeu rifa e artesanato, teve um grande amigo que morreu de AIDS, escreveu incontáveis diários, raspou a cabeça, usou dreadlocks, anéis em todos os dedos e saias longas produzidas na Índia, calçou coturnos, mocassim e salto agulha, pintou a boca de preto, as unhas de azul e o cabelo de vermelho, aderiu ao cabelo loiro com chapinha, deixou de fazer as unhas e de pintar os cabelos brancos, quebrou o pé, fumou maconha, bebeu absinto e virou fã de gim tônica, dormiu nas mesas do Van Gogh, perdeu a melhor amiga e acordou para a vida, inventou poemas e canções em três acordes, sonhou que estava voando e não podia aterrisar, plantou um jardim de flores amarelas, cultivou inços, engordou dez quilos, emagreceu doze, brigou com o vizinho, fez amizade com o porteiro, se apaixonou pelo pedreiro, teve um caso com o professor de filosofia, ficou eufórica achando que a metafísica era a sua linha, desistiu da lógica, virou espírita e mais tarde budista, acampou nos Aparados, pescou um bagre, tomou banho pelada no Guaíba, tornou-se socialista, anarquista, capitalista e niilista, assumiu-se artista, foi modelo vivo e síndica, criou um blog sobre culinária, descobriu que seu ascendente é Libra, admirou a mãe pelo bom-humor e o pai pela postura blasé, entendeu que família é mais um porto que uma porta, tomou um porre com o irmão jurando que o tempo tinha parado, ficou três horas com a irmã ao telefone jurando que o tempo tinha parado, fez seis anos de psicanálise e chorou quando se despediu da psiquiatra, tomou ansiolíticos, estimulantes e antidepressivos, se separou pela segunda vez como se fosse a primeira, dormiu com o melhor amigo, virou vegetariana, pulou carnaval na Bahia, desfilou em escola de samba, foi fã do Jim Morrison, assistiu Legião na primeira fila, encarou a pista no show dos Stones, pegou caxumba e catapora, vacinou-se contra a gripe suína, torceu pela Argentina, bateu de carro num fusca zero km, contou os azulejos do banheiro e descobriu o resultado ímpar, tirou a televisão do quarto, parou de ver novela, fez peeling, drenagem linfática, reiki e acupuntura, conseguiu meditar, parou de fumar, perdeu o medo de altura e passou a gostar de escadas rolantes, salvou um passarinho que caiu do ninho, emprestou dinheiro e teve que fazer empréstimo para cobrir o cheque especial, plantou uma árvore, perdeu o prazo num processo, reverteu uma sentença no STF, sentiu-se mais feia que Beti, a feia e mais bela que a tal Gisele Bündchen, teve um filho e aprendeu a amar melhor - não necessariamente nessa ordem.

E Zelda acha que fez pouco. 

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